O termo “bitributação” acaba sendo sugestivo, isso porque o prefixo “bi” indica duas, e a tributação certamente refere-se aos tributos. Mas a que exatamente esse “dois” se refere?
A bitributação é um tema muito importante do direito tributário, e está presente no dia a dia de muitos brasileiros, especialmente dos empresários, portanto, você precisa saber exatamente como agir nesta situação.
Então, se você quer entender os principais pontos da bitributação, como o que significa, quem pode sofrer e como evitar, continue acompanhando este artigo que vamos te ajudar.
O que é bitributação?
Bitributação é a incidência de dois tributos sobre o mesmo fato gerador, e estes são cobrados por dois entes federativos diferentes, como dois Municípios, por exemplo.
Vamos por partes, iniciando pelos conceitos de fato gerador e quais são os entes federativos.
Fato gerador é a ação praticada pelo contribuinte que dá início à obrigação tributária. Ou seja, quando uma pessoa pratica determinada ação da qual incide tributo (aufere renda, vende mercadorias…), passa a ser obrigada a arcar com o tributo.
Os sujeitos passivos dos tributos são sempre os entes federativos, que são União, Estado, Distrito Federal e o Município. Assim, ao pagar um tributo, um destes será o responsável por cobrar e receber os valores.
Partimos agora ao conceito de tributo, e quais os tributos que existem no Brasil.
Tributos são valores a serem pagos pelos cidadãos ao Estado, que deverá utilizar tais valores para garantir melhores condições de vida aos contribuintes, direcionando as contribuições para a saúde, educação, transporte e quaisquer áreas de interesse da população.
Tipos de bitributação
Atualmente, os tributos existentes são taxas, empréstimos compulsórios, contribuições de melhoria, contribuições especiais e os impostos, os quais discutiremos a seguir.
Taxas: são espécies de tributo por meio das quais o contribuinte, quer seja pessoa jurídica ou pessoa física, utiliza serviços públicos específicos e divisíveis. Um exemplo são as taxas de emissão de documentos ou taxas de coleta de lixo residencial ou ainda viabiliza o exercício do poder de polícia pelo ente público como no caso da taxa de vistoria para licenciamento de funcionamento comercial. Portanto, as taxas têm estas finalidades específicas.
Empréstimos compulsórios: como o próprio nome diz, são empréstimos obrigatórios que podem ser instituídos pela União e terão destino específico, muito embora sem vínculo à atividade do estado. Tal situação ocorreu no Brasil, ficando muito famosa através do “confisco” das contas realizado pelo ex-presidente Fernando Collor de Mello. Portanto, nesta modalidade, o cidadão é obrigado a emprestar dinheiro ao estado, e o valor deve ser devolvido posteriormente, corrigido.
Contribuições de melhoria: são valores cobrados em decorrência da valorização observada no imóvel do contribuinte pela execução de obra pública, como por exemplo, a valorização do imóvel pelo asfaltamento da via pública. Se uma casa foi valorizada pelo fato de a rua de acesso ter sido asfaltada, poderá ser cobrada a contribuição de melhoria, onde o contribuinte deverá pagar pela valorização que seu imóvel recebeu.
Contribuições especiais: este tributo não possui um fato gerador específico, e sua função não é o custeio da atividade do estado, mas sim a intervenção econômica e social para a qual foi criada. Ou seja, o tributo é criado com uma finalidade específica, que pode ser social, de intervenção do domínio econômico ou de interesse de categoria profissional ou econômica.
Impostos: são valores a serem pagos pelo contribuinte ao ente federado competente, em decorrência de um fato gerador, mas sem vinculação a alguma atividade administrativa específica. Podemos citar aqui como exemplos o IRRF (Imposto de renda retido na fonte), o IR (Imposto de renda) e o ITBI (Imposto de Transmissão de Bens Móveis).
É possível utilizar como exemplo o Imposto sobre Transferência de Bens Imóveis, o fato gerador de tal imposto é transferir um bem móvel, portando qualquer indivíduo que transferir um bem imóvel, deverá arcar com tal imposto.
Podemos ainda utilizar o seguinte exemplo: a residência de João fica entre a divisa do Município A com o Município B, havendo dificuldade na delimitação das áreas. Ambos os Municípios enviam os carnês de pagamento de Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) à residência de João. Neste caso, ocorreu uma bitributação, e João precisará comprovar de qual município sua residência faz parte, pagando apenas um dos impostos.
Por que acontece?
A bitributação acontece pela confusão da competência para cobrar determinados tributos, mesmo estando estipuladas as responsabilidades e competências de cada ente federativo, da seguinte forma:
União
- Operações de crédito, seguro, câmbio e as relativas a títulos;
- Grandes fortunas (nos termos de lei complementar);
- Produtos industrializados;
- Importação;
- Exportação;
- Propriedades rurais;
- Renda e proventos.
Estados
- Operações provenientes de circulação de mercadorias, prestação de serviços de comunicação e transporte intermunicipal e interestadual, inclusive as operações iniciadas no exterior;
- Transmissão de causa mortis e doação de bens e direitos;
- Propriedade de veículos automotores.
Municípios
- Transmissão “intervivos” de qualquer título, seja por ato oneroso, por natureza ou acessão física, de bens imóveis e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição;
- Serviços de qualquer natureza não compreendidos no art. 155, II da CF, de qualquer natureza;
- Sobre propriedade predial e territorial urbana.
Portanto, a bitributação pode ocorrer nos casos de incerteza da localização de imóveis, bem como do local da prestação do serviço.
Nestes casos, resta ao contribuinte, com o auxílio de profissional competente, identificar quais dos tributos são realmente devidos.
Quando acontece?
A bitributação ocorre nos casos em que dois Estados ou dois Municípios entram em conflito, cobrando do contribuinte um tributo decorrente de um mesmo fato gerador.
O Imposto Sobre Serviços também costuma ser alvo da bitributação. O ISS é um imposto de competência municipal, e deve ser recolhido por qualquer Pessoa Física ou Pessoa Jurídica que tenha prestado um serviço.
Este imposto deve ser pago ao Município do prestador do serviço, ou seja, do CNPJ nos casos de Pessoa Jurídica ou da residência da Pessoa Física.
Assim, podem ocorrer confusões quanto ao local de pagamento do tributo, porque eventualmente as empresas e pessoas prestam serviços em outros municípios, podendo ocorrer a bitributação.
Vale lembrar que a bitributação, em regra, é ilegal, sendo permitida apenas em duas situações que são: situações de guerra ou através de tributação internacional. Assim, fica autorizada a cobrança de tributos extraordinários na iminência de conflitos internacionais, que deverão ser gradativamente extintos com o fim da guerra.
Ainda, a depender da relação entre as nações, podem ser realizadas cobranças de tributos de mercadorias e serviços oriundos de países estrangeiros.
Quem está sujeito a sofrer com a bitributação?
Tanto as Pessoas Físicas como as Pessoas Jurídicas podem ser alvo da bitributação, porém, a PJ tende a ter maior probabilidade de sofrer pela dupla tributação.
Isso acontece porque geralmente as empresas lidam com mais tributos, que inclusive podem ser cobrados duas vezes de um mesmo CNPJ, como o Imposto Sobre Serviços (ISS) e o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).
Outro motivo pelo qual as Pessoas Jurídicas devem estar atentas às possíveis ocorrências de bitributação é o fato de serem mais propensos a realizarem conexões entre municípios e estados, o que facilita a ocorrência.
ICMS e a bitributação
O Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços é de competência dos Estados, e é recolhido pensando na aplicação em infraestrutura, bens e serviços do Estado.
O ICMS e a bitributação se relacionam no seguinte ponto: quando uma mercadoria for vendida no Estado A e entregue no Estado B, a quem será pago o ICMS?
Inicialmente, o ICMS era devido apenas ao Estado de origem da mercadoria. Tal previsão incentivou diversas empresas a abrirem suas sedes em estados que possuíam um ICMS menor, prejudicando assim os demais estados.
Dessa forma, em 2011, os estados firmaram um acordo para que o ICMS fosse pago tanto na origem da mercadoria como no destino, este documento ficou conhecido como Protocolo ICMS 21.
Porém, tal medida foi prejudicial aos comerciantes online e, ainda, foi considerada inconstitucional pelo STF em 2014.
Já em 2015, foi publicada uma emenda constitucional, a Emenda Constitucional 87/2015, que instituiu um imposto interestadual, que seria dividido entre os estados de origem e destino das mercadorias.
Exemplos de bitributação
Exemplo 1: Bitributação no ISS
A empresa A, constituída e registrada no Município 1, presta costumeiramente serviços no Município 2. Os órgãos fiscalizadores dos municípios 1 e 2 entendem ser competentes pela cobrança do Imposto Sobre Serviços.
Neste caso, o ISS é devido apenas à cidade onde está registrado o CNPJ da empresa A. Mas, por confusão dos órgãos fiscalizadores, ambos municípios realizaram a cobrança do ISS, que deve ser pago apenas ao Município 1.
Exemplo 2: Bitributação no IPTU
A empresa A tem sua sede na divisa entre os municípios 1 e 2, havendo dificuldades na fixação dos limites. No ano de 2022 recebeu dois carnês referentes ao pagamento do IPTU, um de cada município.
Neste caso, deverá a empresa A demonstrar que pertence a um dos municípios, pagando assim apenas um dos IPTUs.
Diferença entre bitributação e Bis in Idem
Como visto, a bitributação é a situação onde dois entes diferentes, realizam cobrança de um tributo pelo mesmo fato gerador. Já no Bis In Idem, a cobrança duplicada é realizada pelo mesmo ente federativo.
Por exemplo: o Município A realiza duas vezes a cobrança do IPTU do mesmo imóvel. Na bitributação, a cobrança deveria ter sido realizada por dois municípios diferentes.
A bitributação é, em regra, ilegal. Quanto ao Bis In Idem, não existem previsões legais de proibição.
Como exemplo do Bis In Idem podemos citar a cobrança de Imposto de Renda (IR) e Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido (CSLL), sobre a auferição de lucro.
Portanto, existem situações em que o Bis In Idem pode ocorrer dentro da Lei e respeitando os ditames da Constituição Federal.
A quem recorrer em casos de bitributação?
A melhor opção é recorrer a um profissional especializado na área tributária. Tendo em vista que os profissionais lidam quase todos os dias com a legislação tributária, já estão familiarizados e conhecem as normas, regras e possíveis mudanças.
Você pode contratar serviços de consultoria, onde o profissional irá avaliar sua situação e aconselhar as melhores opções, bem como serviços de assessoria, onde o profissional atuará em seu favor.
Como evitar?
A bitributação pode ser muito prejudicial para as empresas, podendo comprometer diversas áreas. Este transtorno pode ser evitado através de alguns cuidados.
Nos casos de serviços e mercadorias oriundas do exterior, basta realizar o pagamento de todos os tributos cobrados. Isso porque a legislação permite a bitributação nestes casos, a depender dos acordos internacionais dos quais o Brasil faz parte.
Já nas situações em que a bitributação é ilegal, recomenda-se que os empresários contem sempre com suporte de uma contabilidade, que pode ser realizado até através de acompanhamento mensal e/ou digital.
Como já referido, profissionais da área têm maior conhecimento e mais facilidade ao lidar com a bitributação. Eles são uma ótima opção aos empresários que precisam de auxílio
Outra medida a ser adotada é a construção de um planejamento tributário. Isso consiste em um conjunto de estudos, ações e estratégias que tem como fim encontrar maneiras de reduzir os tributos a serem pagos.
Além disso, o planejamento tributário prepara os empresários para saber como, e principalmente quanto, deverão arcar em relação a tributos. Tal planejamento deve ser também realizado por profissionais especialistas na área.
Caso você já tenha arcado com os tributos de uma bitributação ou pagou algum outro imposto indevido é possível recorrer.
Os recursos podem ocorrer nas esferas administrativa e judicial, podendo conceder restituições e compensações de outros tributos que seriam pagos pelo contribuinte.
Para recorrer, basta fundamentar os argumentos com base em documentos e provas, sendo também aconselhado o acompanhamento profissional.
Gostou do conteúdo? Esperamos ter ajudado! Acompanhe também nosso conteúdo sobre Planejamento Tributário.
Caso ainda tenha alguma dúvida, entre em contato com um advogado de sua confiança. Ele dará todo o direcionamento que você precisa para melhor resolução do seu caso.