O sistema de saúde pública no Brasil enfrenta diversos desafios com um atendimento de pouca qualidade e insuficiente para toda a população. Não é nada incomum vermos notícias sobre a falta de leitos, médicos, materiais, medicamentos, enfermarias lotadas e longas filas de espera, assim como cancelamento de plano de saúde por inadimplência.
Aqueles que têm condições, e preferem não ficar à mercê do SUS, acabam contratando um plano de saúde privado. Porém, quando as contas apertam uma das primeiras coisas a ser cortada do orçamento é este serviço.
A pandemia do novo coronavírus mudou significativamente a vida de muitos brasileiros, além de todo sofrimento causado pela perda de um parente ou amigo próximo, impactou negativamente a situação financeira de muitas famílias.
No meio de um surto de contágio do coronavírus, um caos no sistema de saúde pública e uma difícil situação financeira, muitas pessoas tiveram seu planejamento financeiro familiar prejudicado, o que levou a um aumento do número de inadimplência nos contratos de plano de saúde privado.
Quer saber se a operadora pode cancelar o seu plano de saúde por falta de pagamento? Quer cancelar o seu plano mas não sabe como fazer? Teve o seu plano cancelado e nem sabia? A Agência Nacional de Saúde já regulamentou esse assunto e tem muita coisa que você precisa saber. Ficou interessado? Então continua aqui que a gente te explica.
Como ficaram as regras de cancelamento do plano de saúde?
Antes de tratar especificamente das regras de cancelamento de planos de saúde, é preciso entender quais são as suas modalidades de contratação.
Em geral, a contratação de um plano de saúde pode ser feita de três formas: através de um plano individual ou familiar, de um plano empresarial, ou coletivo por adesão. Vamos ver cada uma delas?
Plano individual ou familiar
O plano individual ou familiar é quando você procura uma das operadoras de planos de saúde e faz a contratação de um plano. Esse plano pode ser individual, somente para o titular, ou familiar quando incluir mais membros de uma mesma família no mesmo plano.
São planos de livre adesão, normalmente possuem um período de carência e a cobertura é determinada de acordo com o contrato e o rol de procedimentos do plano aderido. A cobrança é feita diretamente ao consumidor pela própria operadora.
Plano empresarial
O plano empresarial ou coletivo empresarial é quando a sua empresa contrata um plano para você. Nesse caso é exigido um vínculo empregatício com uma pessoa jurídica ou sob regime estatutário. Também podem prever um período de carência, exceto em contratos com 30 ou mais beneficiários, ou para beneficiários que ingressarem no plano em até 30 dias da celebração do contrato ou de sua vinculação à empresa.
A cobertura se dará conforme o contrato e o rol de procedimentos, e a cobrança pode ser feita diretamente ao consumidor pela operadora ou pela pessoa jurídica contratante, como por exemplo por desconto em folha de pagamento.
Planos coletivos por adesão
Os planos coletivos por adesão são aqueles organizados e contratados por uma associação profissional ou sindicato. Aqueles que desejam se beneficiar desse tipo de plano devem estar vinculados a uma associação profissional ou sindicato. As regras de carência de adesão são as mesmas previstas para o plano coletivo empresarial e a cobertura também se dará conforme o contrato e o rol de procedimentos.
É importante saber qual o tipo de plano contratado, pois isto irá influenciar nas regras de cancelamento.
Mas antes de cancelar o seu plano, existem algumas informações importantes que você precisa conhecer.
O que eu preciso saber antes de cancelar o plano de saúde?
A primeira delas é que o seu pedido de cancelamento ou exclusão terá efeito imediato. Logo, assim que a operadora tomar ciência do seu pedido você não terá mais qualquer cobertura pelo seu plano e você não poderá mais voltar atrás. Nenhum procedimento poderá ser efetuado pelo plano após o pedido de cancelamento, mesmo que ele já tenha sido autorizado pela operadora.
Quaisquer despesas geradas até a data do pedido de cancelamento, como de mensalidades em atraso, franquias ou coparticipação são de responsabilidade do beneficiário do plano.
Caso tenha sido solicitado o cancelamento de um plano individual ou familiar, os dependentes podem optar por continuar no plano, devendo se manter as condições anteriormente contratadas, desde que passem a assumir as obrigações como titulares.
Já para o caso dos contratos coletivos, a manutenção ou não dos dependentes no plano de saúde vai depender do que estiver disposto no contrato.
Além disso, o cancelamento ou exclusão do plano de saúde pode gerar alguns efeitos. Veja a lista que preparamos para você:
Efeitos do cancelamento ou exclusão do plano de saúde |
A exigência do cumprimento de novos prazos de carência em uma nova contratação. |
Caso a solicitação de cancelamento não tenha se dado por motivo de pedido de portabilidade de plano, ocorre a perda do direito à portabilidade de carência. |
A exigência de preenchimento de uma nova declaração de saúde, o que pode vir a alterar a cobertura contratada no caso de doenças preexistentes. |
Perda imediata do direito de remissão. |
O cancelamento do plano de saúde pode se dar de duas maneiras: a pedido do consumidor ou por iniciativa da operadora. Vamos ver agora como o consumidor deve proceder ao solicitar o cancelamento do plano e quais as hipóteses em que a operadora pode realizar o cancelamento por iniciativa própria.
Cancelamento a pedido do Consumidor
Lembra que falamos que as regras de cancelamento podem mudar de acordo com o tipo de plano? Então vamos ver o cancelamento por plano, ok?!
Contrato individual ou familiar: você poderá fazer a solicitação de cancelamento pessoalmente, pelo telefone ou pela internet nos canais disponibilizados pela sua operadora.
Em qualquer um dos casos, a operadora deve fornecer um comprovante de cancelamento ao usuário em que deve constar um número de protocolo do atendimento.
Plano empresarial ou coletivo empresarial: você deve solicitar o cancelamento à empresa a qual o seu plano está vinculado. A empresa terá 30 dias para efetuar o cancelamento perante a operadora. Se o cancelamento não for efetuado dentro deste prazo, o usuário poderá fazer a solicitação diretamente à operadora do plano.
Cabe à operadora fornecer ao titular solicitante o comprovante do pedido de cancelamento.
Planos coletivos por adesão: vale destacar aqui que as associações ou sindicatos normalmente contam com o auxílio de uma administradora de benefícios. Nesses casos, o usuário pode solicitar o cancelamento perante a administradora, ao sindicato ou associação ou diretamente à operadora. No entanto, é recomendado que o pedido de cancelamento seja direcionado à administradora ou à operadora diretamente.
As formas de solicitar são as mesmas que para o plano individual, ou seja, pode ser feita presencialmente, por telefone ou ainda pela internet. Tanto a administradora como a operadora tem o dever de fornecer ao beneficiário o comprovante do pedido de exclusão do contrato.
No caso do pedido ser direcionado à pessoa jurídica contratante, associação profissional ou sindicato, a operadora é quem deverá encaminhar ao beneficiário o comprovante da solicitação.
Quando o consumidor solicita o cancelamento do plano de saúde, pode ser cobrada multa pela operadora?
Não! Apesar de estar anteriormente prevista na Resolução Normativa nº 195 de 2009 da Agência Nacional de Saúde a possibilidade da cobrança de multa nos casos de rescisão imotivada antes do período de 12 meses, isso foi derrubado em 2014 com o ajuizamento de uma Ação Civil Pública (nº 0136265-83.2013.4.02.51.01) proposta pelo Procon do estado do Rio de Janeiro.
Recentemente, foi publicada a Resolução Normativa nº 455 de 2020 que anulou disposto no parágrafo único do art. 17, da Resolução Normativa nº 195 de 2009, onde estava prevista a cobrança de multa.
A aplicação de multa nesses casos, tirava o direito de escolha do consumidor e por isso passou a ser considerada abusiva e ilegal.
Cancelamento pela operadora de saúde
O cancelamento do plano de saúde feito por iniciativa da operadora poderá ser cancelado nos casos em que ocorrer fraude do consumidor, perda da elegibilidade/admissibilidade ou o não pagamento por mais de 60 dias nos últimos 12 meses.
Fraude do Consumidor
Nos planos contratados após 1998, quando expressamente solicitado pela operadora, deverá ser preenchido pelo beneficiário uma Declaração de Saúde, momento em que deve também ser informado à operadora a existência de qualquer doença pré existente.
Normalmente, o período de carência para os procedimentos relacionados a uma doença pré-existente são aumentados, alterando-se assim a forma da prestação da cobertura do respectivo plano.
Ocorre que, se ao contratar o plano o consumidor sabendo da existência de alguma doença pré-existente omite isto da sua declaração, pode vir a ser penalizado com a suspensão da cobertura ou a rescisão unilateral contratual, uma vez que tal omissão pode ser caracterizada como fraude.
Constatando-se qualquer indício de fraude por parte do beneficiário, a operadora deverá emitir um Termo de Comunicação ao Beneficiário comunicando-o imediatamente. Nessas circunstâncias a operadora poderá oferecer ao beneficiário uma cobertura parcial temporária ou a adesão de um plano privado.
Poderá ainda oferecer Agravo ou solicitar a abertura de um processo administrativo junto à Agência Nacional de Saúde, quando houver indício de fraude e o beneficiário não aceitar a cobertura parcial temporária. Caracterizada fraude, a operadora poderá efetuar o cancelamento do contrato.
Em caso de fraude, o contrato poderá ser cancelado em qualquer das modalidades de contratação.
Perda da elegibilidade/admissibilidade
Para ocorrer o cancelamento no caso de perda da elegibilidade ou admissibilidade, deve se tratar de uma das modalidades de contratação coletiva, coletiva por adesão ou empresarial.
Assim, se o consumidor tivesse contratado um plano vinculado a alguma associação ou sindicato, ou ao seu empregador, o requisito de elegibilidade é permanecer vinculado. Se ele vier a perder essa condição, ele poderá ser excluído do contrato.
Não pagamento por mais de 60 dias nos últimos 12 meses
Nesse caso, estamos falando do cancelamento ou suspensão do plano de saúde em razão da inadimplência do consumidor. Porém, para que ocorra o cancelamento nesta modalidade não basta a inadimplência do beneficiário, a operadora deve antes observar alguns prazos e seguir alguns passos.
Em relação aos prazos, é necessário que o inadimplemento se dê por um período de pelo menos 60 dias, dentro do período de um ano de vigência do contrato. O beneficiário deve ficar atento a este prazo, pois pode ser consecutivo, 60 dias corridos, ou acumulado, quando houver o atraso de 20 dias de atraso durante três meses seguidos, por exemplo.
Quanto ao procedimento, a operadora deve no 50º dia de atraso enviar uma comunicação ao beneficiário, informando a condição de inadimplência e a possibilidade de cancelamento do plano. A operadora deve se certificar ainda que o beneficiário foi comprovadamente avisado.
Caso o cancelamento ocorra sem esta notificação prévia, será cosiderado ilegal e a operadora pode ficar sujeia a aplicação de penalidade pela ANS e/ou a uma ação de indenização proposta pelo usuário.
No entanto, vale ressaltar que se o consumidor não deseja mais usufruir do plano de saúde, ele tem o dever de comunicar à operadora, não devendo esperar até que a operadora realize o cancelamento por inadimplência, por exemplo, pois ainda estará obrigado a pagar as parcelas em atraso.
Notificação até o 50º dia de inadimplência
Os planos de saúde são regulamentados e fiscalizados pela ANS, contudo o que muitas pessoas não sabem é que esta relação contratual é amplamente protegida também pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC).
O CDC é o dispositivo legal que garante o equilíbrio entre as partes nos contratos de plano de saúde, junto à Lei do Plano de Saúde formam o conjunto de normas que regem estes serviços.
O atendimento ao consumidor não pode ser negado, nem mesmo suspenso, antes do prazo de 60 dias de inadimplência. Portanto, caso a prestadora do serviço se negue a atender o paciente com o atraso do pagamento ainda dentro desse prazo estará cometendo um ato ilícito.
De qualquer maneira, existe uma obrigação legal da notificação de cancelamento, o que nem sempre é cumprido pelas operadoras de planos de saúde.
Está previsto na legislação brasileira que o operador do plano de saúde só poderá rescindir ou suspender o plano unilateralmente se notificar o consumidor no quinquagésimo dia do atraso. Essa medida foi adotada para que o consumidor tenha pelo menos um prazo de 10 dias para regularizar os pagamentos, evitando assim o cancelamento unilateral do seu plano de saúde.
Cancelamento abusivo
Como vimos anteriormente, o contrato poderá ser cancelado de forma unilateral pela operadora quando ocorrer fraude ou o atraso do pagamento em um período maior que 60 dias, desde que o beneficiário seja notificado até o 50º dia de atraso.
Se o cancelamento ocorrer fora dessas hipóteses, e não sendo o caso de perda de elegibilidade/admissibilidade, a operadora do plano de saúde está incorrendo em um ato ilega, fato que caracteriza um cancelamento abusivo.
Nestas situações, o beneficiário tem a opção de entrar em contato com a operadora e tentar amigavelmente a reativação do seu plano de saúde, mas infelizmente essa tentativa de boa-fé quase sempre é frustrada, obrigando assim o consumidor procurar ajuda pelas vias judiciais.
Restabelecimento imediato do plano de saúde
Quando se tratar de um cancelamento abusivo, o consumidor poderá solicitar o restabelecimento imediato do seu plano. Nesses casos, pode-se buscar a ajuda de um profissional especializado para que ele faça o respectivo requerimento e reative o plano.
Lembre-se, caso tenha seu plano de saúde cancelado de maneira abusiva, analise a necessidade de procurar ajuda com um advogado especializado, que está munido dos conhecimentos que vão garantir seu direito.
Podemos citar como exemplo a liminar obtida no processo 1023498-13.2020.8.26.0001 para reativar o plano de saúde do nosso cliente.
Além da reativação do seu plano pode ser que você tenha também direito a uma reparação moral. Isso é o que veremos no próximo tópico.
Indenização por danos morais no caso de cancelamento de plano de saúde
A caracterização ou não de danos morais irá depender da análise de caso concreto. Por isso é muito importante que se você sentiu lesado de alguma forma procure o auxílio de um profissional especializado e de sua confiança para que ele analise o seu caso em específico.
A título exemplificativo, vamos citar um caso julgado recentemente pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. (TJSP; Apelação Cível 1003937-70.2020.8.26.0011).
Nesse caso, o beneficiário teve o seu plano cancelado em razão do inadimplemento. No entanto, sofreu um acidente e necessitou de atendimento médico, o qual foi negado pela operadora, uma vez que já haviam decorridos os 60 dias de atraso. O beneficiário acabou arcando com todos os custos do referido atendimento.
Ele teria tentado negociar as referidas parcelas ainda antes do acidente, o que nos mostra que ele tinha conhecimento do atraso. Além disso, o contrato da sua operadora trazia uma cláusula que excluía a necessidade de notificação em caso de atraso.
Por fim, a operadora de saúde foi condenada a pagar ao beneficiário uma indenização por danos morais por ter-lhe recusado o atendimento e a ressarcir as despesas que ele teve com a cirurgia e demais procedimentos decorrentes do acidente. Isto porque a cláusula contratual que previa a dispensa de notificação foi considerada ilegal e abusiva, e também porque a operadora não logrou exito em comprovar que teria informado o beneficiário sobre a inadimplencia e cancelamento do plano.
Viu só como são importantes os prazos e procedimentos! Gostou deste conteúdo? Ficou com alguma dúvida? Quer saber se o seu caso é um caso de dano moral? Então deixe o seu comentário ou entre em contato conosco.